loading

- Publicidade -

Avatar

Carla Henriques

Mãe | Encaro cada desafio com a convicção de que há sempre um bem maior pelo qual vale a pena lutar e permanecer | Licenciada em Direito | Diretora de Compliance | Acredito na formação e com ela aposto na justiça e crescimento pessoal, mas acima de tudo, na procura da felicidade | Vivo na serenidade da Figueira da Foz, onde o mar é o meu eterno refúgio e conselheiro.

- Publicidade -

Tema: O reflexo das redes sociaisData de Publicação: 17/02/2025, 11h24
A Mulher como objeto: O reflexo das redes sociais
Mulher a relaxar no parque ©Imagem de Freepik
Mulher a relaxar no parque ©Imagem de Freepik

Hoje quero falar-vos de um tema que me preocupa, que nos devia preocupar a todas, na verdade.

Vivemos numa era paradoxal, onde a liberdade de expressão de cada um de nós convive com a superficialidade e a objetificação. As redes sociais, que poderiam ser vistas como um espaço de conexão autêntica e partilha genuína, tornaram-se, para muitas de nós, um campo minado. Um local onde a exposição se confunde com permissão e onde a nossa autonomia e liberdade sobre a própria imagem é frequentemente usurpada pelo olhar alheio e julgada.

Uma mulher publicou uma fotografia. Porque sim. Talvez porque gostou do ângulo, porque se sentiu confiante, porque quis partilhar um momento de bem-estar consigo mesma, porque se sentiu bonita ou simplesmente porque lhe apeteceu. Sem precisar de se justificar, sem ter de dar explicações. Mas num instante, essa escolha pessoal pode ser distorcida. Multiplicam-se as mensagens inapropriadas, os comentários invasivos, as insinuações que nunca foram pedidas. Para alguns, o simples facto de uma mulher se mostrar significa que está disponível. Que procura um caso. Que quer atenção.

É como se a sociedade tivesse reaproveitado os antigos padrões de objetificação feminina, os tivesse adaptado ao mundo digital e os amplificasse através de algoritmos, agora protegidos pelo véu do anonimato. O corpo da mulher continua a ser visto como um domínio público, algo passível de avaliação, julgamento e, demasiadas vezes, desrespeito sem consequências.

Pode parecer um exagero para alguns, mas a verdade é que isto continua a acontecer – todos os dias, em diferentes formas, perante o silêncio ou a normalização de muitos.

E a pergunta que se impõe é: porquê?

Porque é que a confiança de uma mulher é tantas vezes interpretada como um apelo? Porque é que a sua autoestima incomoda? Porque é que ainda persiste a ideia de que a exibição do próprio corpo equivale a um convite?

Desenganem-se. O problema não está na fotografia partilhada. O problema está no olhar de quem a vê. A cultura patriarcal, ainda profundamente enraizada, apenas encontrou novas formas de se perpetuar no espaço digital. Se antes a vigilância do corpo feminino era feita por normas sociais e regras implícitas, agora exerce-se através de comentários, mensagens e julgamentos instantâneos, legitimados pelo distanciamento, anonimato e impunidade que a tecnologia tem proporcionado.

Mas uma mulher não é um objeto! Não é um corpo à disposição do desejo alheio, nem uma tela em branco onde se projetam interpretações deturpadas. Publicar uma fotografia não significa procurar validação, muito menos abrir portas ao assédio. É um ato de expressão pessoal que devia ser entendido como tal – e nada mais.

Somos livres. Devíamos poder ser quem queremos, fazer o que querermos, sem medo de julgamentos ou de comentários ofensivos.

Se algo precisa de mudar, não somos nós, nem a forma como escolhemos apresentarmo-nos ao mundo. O que precisa de mudar é o olhar sobre nós, a forma como continuamos a ser vistas. O olhar masculino, condicionado por séculos de apropriação do corpo feminino, precisa de ser desconstruído para dar lugar a uma nova perspetiva – uma que reconheça que a nossa liberdade de ser não é sinónimo de disponibilidade para servir.

Mas a verdade é que não é apenas o olhar masculino que precisa de mudar. Também nós, mulheres, muitas vezes nos julgamos entre nós. Infelizmente, é uma realidade.

O machismo não se manifesta apenas nas atitudes dos homens, mas também se infiltra nos nossos próprios pensamentos e comportamentos. Crescemos a ouvir frases como "as mulheres são as piores inimigas umas das outras" ou "uma mulher bonita não pode ser inteligente", e, sem nos apercebermos, essas crenças enraízam-se e tornam-se mecanismos de validação social.

O machismo internalizado leva-nos a criticar e rotularmo-nos umas às outras, perpetuando estereótipos que, ironicamente, tanto combatemos. Quando julgamos uma mulher pela forma como se veste, pelo modo como se expressa ou pelas suas escolhas pessoais, estamos, sem querer, a reforçar a mesma mentalidade que nos limita. Frases como "está a pedir atenção", "é uma exibicionista", "devia ter mais juízo", são pequenos exemplos de como replicamos, entre nós, o discurso que nos oprime.

Esta cultura de julgamento alimenta a divisão entre mulheres, o que acaba por ser um dos maiores obstáculos para a mudança social. A falta de solidariedade enfraquece-nos como coletivo e dá mais força a um sistema que beneficia dessa desunião. Quando estamos demasiado ocupadas a competir entre nós, esquecemo-nos do verdadeiro adversário: a estrutura patriarcal que nos ensinou a desconfiar umas das outras.

Mas a verdade é que não temos de ser rivais. Não temos de olhar para outras mulheres como ameaças, mas sim como aliadas. A mudança começa quando passamos a reconhecer que cada mulher tem o direito de ser e agir como quiser, sem ser rotulada ou atacada por outras mulheres. Quando compreendemos que a liberdade da outra não limita a nossa, mas sim fortalece um caminho que podemos trilhar juntas, damos um passo essencial rumo à verdadeira solidariedade feminina.

Se queremos que o mundo nos veja de forma diferente, temos primeiro de mudar a forma como nos vemos a nós mesmas e umas às outras. O empoderamento feminino não se trata apenas de exigir respeito dos homens, mas também de construir um espaço onde todas as mulheres se sintam livres para serem quem são, quem querem ser, sem medo de serem julgadas ou criticadas.

A verdadeira revolução começa na nossa forma de pensar e na maneira como escolhemos apoiar, em vez de criticar, as mulheres à nossa volta.

Até que isso aconteça, continuaremos a viver num ciclo onde a nossa autonomia e liberdade é confundida com um aval implícito para a invasão e o desrespeito.

É imperativo que, coletivamente, homens e mulheres, reflitam sobre as suas atitudes e perceções, promovendo uma mudança cultural que valorize a individualidade e a liberdade de cada mulher, livre de julgamentos e imposições.

Afinal, no fim das contas, isso revela muito mais sobre quem observa do que sobre quem se expressa!

- Publicidade -

()Comentários

loading
A verificar login...

Últimos artigos do autor

loading

Artigos de Opinião da Região

loading