Numa era de hiperconectividade, a ilusão de conhecimento e a fragmentação da realidade desafiam a comunicação autêntica e estratégica.
As ideias que irei passar abaixo são a minha percepção e que de todo se prenderão a alguém em concreto, mas a uma constatação maior que vou verificando ser persistentemente observada por mim, mas também por uma grande parte de profissionais que têm estudado a comunicação e comportamentos organizacionais.
Vivemos tempos em que a informação circula à velocidade de um clique. Mas será que o acesso constante nos aproxima da verdade, ou apenas reforça as paredes da bolha onde já vivemos? A teoria das bolhas de informação, estudada por Eli Pariser, explica como os algoritmos das redes sociais moldam os conteúdos que vemos, com base nas nossas preferências e interações passadas. Resultado: ficamos presos a visões do mundo que confirmam o que já acreditamos, sem espaço para o contraditório ou o inesperado.
Pensamentos extremistas muitas vezes decorrem precisamente do crescimento de uma bola de neve de ações que permitiram o aporte de ideias e conceitos que foram validando as primeiras impressões.
É aqui que a metáfora da caverna de Platão se torna mais relevante do que nunca. Olhamos sombras projetadas na parede — os conteúdos curados pelos algoritmos — acreditando que são a realidade. Quando, na verdade, existe uma complexidade muito maior por explorar. Aquilo que não vemos, ou que ignoramos inconscientemente, pode ser tão ou mais importante do que aquilo que nos mostram.
Essa visão limitada, somada à confiança excessiva que muitos depositam no pouco que sabem, ajuda a explicar a prevalência do efeito Dunning-Kruger: uma distorção cognitiva que leva pessoas com baixo conhecimento sobre um tema a sobrestimarem as suas competências. Aplicado à comunicação e ao marketing, este efeito é evidente. Muitos utilizadores e até decisores acreditam dominar estas áreas apenas por usarem redes sociais ou por terem opiniões pessoais sobre campanhas e marcas. Ignoram que Marketing e Comunicação são ciências, com fundamentos, técnica e complexidade — domínios que nem mesmo os recém-licenciados dominam por completo.
Quem me segue já deverá ter lido o que penso e escrevi sobre a Teoria da Caverna, o efeito Dunning-Kruger e mesmo sobre o efeito Borboleta.
A prática revela que não há fórmulas mágicas nem modelos estanques. O que funciona num contexto pode falhar noutro. E, tal como no efeito borboleta, uma pequena ação — um post, uma frase, uma imagem — pode desencadear reações em cadeia difíceis de prever, com impactos globais e muitas vezes irreversíveis. O micro enquadra-se no macro. A árvore está dentro da floresta, mas é só com distanciamento crítico que conseguimos vê-la em perspectiva.
Pensar estrategicamente em comunicação é, por isso, um exercício de humildade. Requer sair da bolha, abandonar a caverna, duvidar das certezas absolutas. É preciso recuar, olhar a floresta de fora, perceber os sistemas em jogo, os contextos culturais, sociais e tecnológicos. Exige escuta, análise, experimentação e, acima de tudo, a consciência de que a realidade não se esgota nos nossos ecrãs nem nas nossas crenças.
Ainda há quem venda soluções milagrosas. Uns tiveram sorte numa ação e querem vender replicas sem compreender especificidades, outros querem vender o que leram sem nunca ter tido oportunidade de experimentar e outros ainda querem mostrar-se os grandes treinadores, por terem feito parte de um sucesso onde só o facto de fazerem parte da equipa já era sucesso garantido - tipo ser treinador de um clube com condições para ser campeão, ou trabalhar numa estrutura que disponibiliza tudo para se tornar uma ideia realidade.
Mas agora dá-lhe para a mão um problema sério e vamos ver até que ponto consegue apresentar a solução com menos recursos, ou às vezes até com os mesmos, mas a pensar por si!
A ilusão de conhecimento pode ser confortável, mas é perigosa.
Mais do que nunca, precisamos de comunicação lúcida, crítica e consciente — capaz de atravessar bolhas, de resistir a algoritmos e de iluminar o que está para lá da parede da caverna.
Precisamos de decisores que saibam perceber e ver com olhos de ver, de que forma e onde estão a validar as suas decisões.
Há, ainda, assessorias, consultorias e direções que pretendem que nos mantenhamos na caverna e de todo pretendem que vejamos a luz exterior.
Vale a pena pensar nisso.