Vivemos ligados. Ligados ao mundo, às notícias, às tendências, às modas e, ironicamente, cada vez menos uns aos outros.
O telemóvel, essa pequena janela para o universo digital, transformou-se numa porta de saída da realidade tangível. Passamos horas a olhar para ecrãs e minutos — quando muito — a olhar nos olhos de quem está ao nosso lado. E o mais curioso é que já tivemos sinais, alertas bem claros de que este caminho pode estar a levar-nos para um lugar perigoso.
O confinamento da pandemia da Covid-19 foi um desses momentos de insight coletivo: a solidão pesou, a falta de toque doeu, a ausência da presença mostrou o quanto precisamos uns dos outros. Mais recentemente, o apagão que cortou as comunicações em Portugal devolveu-nos brevemente ao mundo offline — e ainda assim, mal voltou o sinal, voltámos a correr para o conforto do scroll infinito.
Parece que, como os peixinhos dourados, temos memória curta. Ou talvez, como os burros com palas (com todo o respeito por esses animais notavelmente inteligentes), recusamo-nos a olhar para os lados e ver o que realmente está a acontecer.
Recordo uma velha campanha rodoviária que dizia: "Mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto." Hoje, diria: mais vale perder um minuto a conversar com alguém do que passar uma vida a distribuir likes. As relações são como plantas — precisam de ser regadas com tempo, atenção e presença. Será que um like no Instagram é regar uma amizade? Será que reagir com um emoji num story substitui um abraço, uma conversa, uma gargalhada partilhada?
Vivemos em bolhas. Bolhas criadas por algoritmos que nos mostram o que a máquina considera que gostamos, o que os nossos amigos vêem, o que o nosso histórico sugere. Bolhas que nos protegem de tudo... exceto da monotonia do pensamento único.
Diz-me com quem interages e dir-te-ei o que o algoritmo quer que tu sejas. E nessa lógica, um post com muitos likes não significa que foi realmente lido, nem que tocou quem precisava de o sentir. Há quem veja e não reaja. Há quem reaja para estar no radar. Há quem fuja do primeiro comentário por receio de se expor.
A bolha cresce, mas o diálogo encolhe.
E há ainda o paradoxo do discurso atual: todos querem evitar os extremos, mas poucos aceitam o contraditório. Todos querem ser ouvidos, mas poucos estão dispostos a ouvir. A verdadeira evolução — pessoal, social, coletiva — acontece quando somos capazes de encontrar harmonia entre os contrários. Quando aceitamos o confronto de ideias como fonte de crescimento. Quando percebemos que um like não constrói uma relação, e que a bolha onde vivemos pode ser confortável, mas raramente é transformadora.
Está na hora de saber usar o ecrã. De levantar os olhos. De ponderar um minuto... para ganhar uma vida mais conectada, mais próxima, mais real.