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Viver na aldeia é sonho de uma lisboeta. Empregabilidade atrai jovens para a cidade

Juliana Santos/
16/01/2024, 15h54
/
7 min
Êxodo Rural, Margarida Pinto e Ana Martins @DR
Êxodo Rural, Margarida Pinto e Ana Martins @DR

Nos dias de hoje é cada vez mais comum ouvir falar no fenómeno de êxodo rural ou até mesmo de emigração, não só pela procura de melhores condições de vida, mas também pelo facto de muitos jovens terem a ideia de que as oportunidades estão apenas no meio urbano. Fenómenos que causam o envelhecimento da população no meio rural, esvaziando aldeias, que viram nascer os jovens que não voltam e criam a vida na cidade.

Margarida Pinto, uma jovem de 24 anos que vive atualmente no Porto, mas é natural de Lamas, uma pequena aldeia do distrito de Viseu é um testemunho vivo do êxodo rural. Aos 15 anos mudou-se para a invicta para frequentar o secundário, quando terminou mudou-se para a cidade da Guarda para obter a licenciatura em Gestão, que não terminou, e passado algum tempo voltou para o Porto onde tirou o curso de Gestão e Comércio Internacional. Atualmente trabalha numa empresa de logística. Quase uma década desde que a jovem deixou a aldeia, Margarida não descarta a oportunidade de voltar.

Em conversa com a Central Press, Margarida Pinto confessa que o principal motivo que a levou a mudar-se da aldeia foi “o acesso a um sistema de educação escolar diferente e após terminar os estudos o pouco tempo para conseguir ter uma vaga na área”. Acrescenta que os principais fatores para que os jovens não permaneçam na aldeia é “a falta de oportunidade de trabalho diferenciado com ofertas de bons salários e acesso a novas experiências”.

Por outro lado, a jovem frisa que na cidade “não é tudo um mar de rosas” e que o principal desafio para si é “lidar com o stress diário que é dito normal numa cidade por haver um número bem mais elevado de pessoas”. Se por um lado se procura mais oportunidades na cidade, o custo de vida está bem mais elevado e “com a inflação nota-se ainda mais a diferença, principalmente o valor dos arrendamentos dos imóveis que apesar de já se sentir também nas aldeias, nas cidades o aumento é muito grande”, frisa Margarida.

A gestora confessa que sente falta de motivos que cativem os jovens a se fixarem nas aldeias e a “falta de atividade empresarial que possa fornecer mais perspetivas de emprego aos jovens, quer licenciados como não”, e frisa que o Estado poderia “criar o acesso a novos postos de trabalho, nos quais os jovens podem ter sucesso igualmente”.

Margarida admite que na aldeia “não teria tido o mesmo sucesso que na cidade, pelo menos na área [da gestão]", mas admite que poderia ter "sucesso numa outra área" de atividade à qual se "dedicasse afincadamente, caso estivesse no meio rural”. Conclui que não descarta uma oportunidade de voltar à aldeia “principalmente pelo conforto de estar perto dos familiares, mas para já, os planos são ficar pela cidade, crescer a nível profissional e pessoal. Talvez um dia, a vida me leve de volta às minhas raízes” - remata.

Em contraste, ainda há jovens que preferem o ar puro do meio rural e ficam a construir a uma vida na aldeia. É o caso de Ana Martins, de 27 anos que nasceu na cidade de Lisboa, mas que desde muito cedo se rendeu pelos encantos da aldeia das Quintas de Santo António, a terra dos avós paternos, no distrito de Viseu. Licenciada em Audiologia pela Universidade de Coimbra, Ana trabalha atualmente como assistente dentária na vila de Sátão e reside na aldeia dos avós.

Em conversa com a Central Press, Ana Martins confessa que quis desde nova viver na aldeia, por lá ter tido as maiores amizades" e onde se enamorou e casou. Acrescenta que desde que se lembra “que vibrava e esperava ansiosamente para poder regressar à aldeia". "Estava sempre a contar os dias. Aqui sentia-me livre, sem medos, partilhava momentos com amigos e outras pessoas que talvez numa cidade não seria possível.”

Ana viveu em Lisboa até aos 18 anos, mas rapidamente percebeu que o seu desejo era “o ar puro que na cidade é impossível ter, a proximidade com as pessoas, o aconchego e a paz que se vive. Todos se conhecem, todos se ajudam e isso é muito importante nos dias de hoje.”

Por outro lado, a lisboeta admite que nem sempre é fácil e que na aldeia não há a mesma vantagem “a nível de empregabilidade e de acesso a um conjunto de ofertas que existem na cidade, tanto a nível cultural, artístico e lúdico como social e profissional.”

Confrontada com a realidade de que apenas há oportunidades para os jovens na cidade, Ana discorda e diz que a probabilidade de serem bem-sucedidos numa cidade é maior do que numa aldeia. No entanto, nos meios mais pequenos também pode haver sucesso" - afiança. "Estamos numa era em que o empreendedorismo se enaltece, assim exista a capacidade, se estiverem dispostos, de arriscar e de inovar de modo a que ajudem no desenvolvimento das aldeias.”

A influência familiar também pode causar pressão nos jovens, naturalmente que os pais querem os melhores para os filhos, mas “influenciam e encaminham os sonhos a fim de os tornarem em realizações dos próprios pais, como por exemplo, receber um bom salário,  trabalharem em altos cargos e empresas, entre outros. Deve ser uma escolha de cada um, sempre. E se essa escolha não for permanecer na cidade também pode ser a escolha certa.”

Para Ana Martins os jovens saem da aldeia porque “ambicionam trabalhar na área, mesmo que implique sair da sua cidade ou país, para atingir os seus objetivos”, e acrescenta que isso podia não acontecer se o Estado oferecesse “mais apoios e mais postos de trabalho. Apoios em negócios, em profissões menos notadas, em áreas que estão por desenvolver, principalmente em meios pequenos. Criar iniciativas para que chamem os jovens e não os afastem para outras cidades maiores ou até outros países”.

Questionada sobre a hipótese de sair da aldeia e mudar-se para a cidade no futuro, Ana admite que "não o faria". "Já tive muitas oportunidades de emprego e nunca quis por todas as razões que já mencionei: sociais, familiares e bem-estar físico e emocional. Mudei para a aldeia e na aldeia vou ficar."

"Casei e é aqui que quero continuar a construir o meu projeto de vida. É aqui que me sinto bem e feliz. Em Lisboa sentia-me presa, rodeada de confusão e agitação. Aqui tenho uma vida mais tranquila e saudável" - conclui.

Ambas as jovens consideram ter tomado as melhores decisões e nenhuma delas pensa mudar de vida, pelo menos para já. Ambas concordam que há falta de oportunidades e falta de apoio no meio rural e que são esses os principais fatores que vêm a causar o êxodo rural nos últimos anos.

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